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Manual de maus costumes

Manual de maus costumes

30
Set10

O fim do sonho

jorge c.

Não irei dizer nada de novo neste post. Venho apenas reforçar o que tenho dito nos últimos dois anos e meio. Depois de tudo o que se disse, de todos os avisos sobre o estado das contas públicas, do irrealismo do Governo, da necessidade mais do que evidente de acautelar a despesa, de uma forma absolutamente intolerável e pornográfica, há quem não tenha vergonha e venha defender a governação do Engº Sócrates. É de um desplante sem nome.

O país recebe com tristeza a austeridade do novo plano de reequilíbrio das contas. A verdade é que a necessidade destas medidas é inegável. O que se deve, portanto, discutir é toda a ilusão que o Governo socialista andou a vender durante os últimos anos. Não, as coisas não estavam bem, a crise não tinha acabado, as empresas não tinham capacidade de resposta por falta de medidas preventivas da recessão e o grande investimento público deveria ter sido suspenso. Agora, vai tudo. Parece que os catastrofistas, os alarmistas e toda essa gente do lado do mal tinha alguma razão para recear um tempo em que estas medidas tivessem de ser tomadas. Quem paga somos todos, não é o vizinho do lado. Mas a vitimização e os atestados de ignorância soam sempre melhor a quem julga viver num lugar transcendente onde tudo é possível se fecharmos os olhos e fizermos muita força.

28
Set10

Calimerice

jorge c.

Confesso que ainda hesitei antes de comentar aqui este post de Domingos Farinho. Não queria ser catalogado como um odioso opositor do Governo, por Deus, nem pensar! Mas esta calimerice chateia-me e, com o devido respeito, Domingos, isso foi de Calimero (nós, os iletrados, só sabemos relacionar com coisas menores como desenhos animados).

Não querendo alimentar qualquer polémica com o lado do bem, tudo aquilo me merece meia dúzia de palavras. Em primeiro lugar, torna-se cansativo esta teoria de que estão todos mal e só o Governo é que fala com clareza. Isso não é verdade. Mas parece-me ser um vício do pensamento político afirmar estafadamente que "vai toda a gente ao contrário, só o meu filho é que marcha bem".

Em segundo lugar, tendo em conta os dados a que vamos tendo acesso, e eu confesso-me um leigo em matéria económica, não me parece muito correcto entrar no discurso de que os comentadores é que alimentam isto, os jornais alimentam aquilo, a oposição é responsável por aqueloutro. Os índices de que vamos tendo conhecimento são também (vá lá, admitamos, só um bocadinho) uma causa da governação, senão o Governo não estava ali a fazer nada e estar ou não estar ia dar à mesmíssima coisa.

Em terceiro lugar, quando li aquela parte da "linguagem agressiva e hiperbólica, a ausência de fundamentanção, o excesso descredibilizante, a confiança cega nos aliados, a demonização total dos inimigos, a divisão do mundo entre aliados e inimigos", juro que achei que o Domingos se iria referir à quantidade absurda (isto não é uma hipérbole) de barbaridades que disseram de Manuela Ferreira Leite. Mas afinal não. O Domingos prefere pegar nisso e calimerizar mais um pouco o pobre Governo vítima de bulling político.

Por último, merece-me também um comentário a parte dos "iletrados". É provável que o Domingos viva num meio erudito. Mas o cidadão comum que não tem acesso a informação especializada vive muito da informação politizada, chamemos-lhe assim. Isso irá certamente determinar o seu juízo livre. A sensibilidade política do cidadão não depende de factores específicos, técnicos, mas da sua percepção da realidade segundo a multiplicidade de informação que lhe chega. E é hoje perfeitamente legítimo desconfiar da governação. O que não parece muito lógico é a vitimização do poder 5 anos e meio depois.

28
Set10

Medíocre

jorge c.

Ouvi de manhã na rádio, logo pela fresquinha, umas declarações deploráveis de Defensor de Moura que, segundo os senhores da TSF, eram da mesma família das proferidas pelo Candidato Alegre. Duas aves raras que assaltaram o espaço mediático sem qualquer qualidade política para o cargo a que concorrem - a Presidência da República. Sejamos claros, estamos perante duas pessoas sem a mínima aptidão para o cargo e cujos votos serão muito forçados pelo adversário mais directo - Cavaco Silva.

Torna-se difícil acreditar que alguém pode votar conscientemente e com vontade em dois candidatos que, perante o clima de dúvida face à aprovação do Orçamento, resolvem dizer que o Presidente está a fazer campanha dissimulada ao convocar os partidos. Isto não passa pela cabeça de ninguém tendo em conta a situação política e o impasse que estamos a viver. Era a obrigação do PR tomar tal atitude.

É certo que o comportamento de Cavaco nos últimos tempos não pode agradar a ninguém. O actual PR não pode adiar muito mais o anúncio da sua candidatura. Poderão alguns dizer que não é a altura para andar a apresentar candidaturas e que há coisas mais importantes a tratar. Confesso que já estamos um bocadinho fartos desta conversa de saco e que se torna evidente para todos que Cavaco Silva é um político demasiado calculista para que se caia nisto muitas vezes.

Mas o que não se pode negar é que, enquanto PR, Cavaco tem feito esforços no sentido de promover o entendimento em matérias que precisam de consensualidade, como é o caso do Orçamento de Estado. Por mais voltas que lhe queiram dar, por mais má-fé que queiram a atribuir às suas atitudes, isto é o que qualquer Presidente faria e que, repito, não é mais do que a sua obrigação.

Se tal não serve para provar o tipo de campanha que vem aí dos adversários de Cavaco, então não sei do que mais precisam.

27
Set10

Em cima do joelho

jorge c.

Chegámos à semana de despachar programa sobre o centenário da República. Durante um ano vimos anunciar que o centenário se iria celebrar. Fomos esperando, esperando. Lá apareceram uns livritos muito timidamente, sabe-se lá se feitos ou não à pressa. Na televisão vejo agora uns anúncios sobre umas séries quaisquer. Mas nunca mais soube nada do mastro do Vale do Sousa. O Prof. Santos Silva também anda meio desaparecido, e não só nestas andanças. Também sabemos que se houvesse muita celebração apareciam logo os defensores dos bolsos do contribuinte e a facção monárquica da República de mãos na cabeça.

O que me apetece dizer sobre isto é que estamos prestes a comemorar 100 anos desde o dia em que somos de facto detentores do nosso Estado, todos sem excepção, e que ninguém parece estar muito animado com o acontecimento. Celebrar a normalidade é, também, uma forma de preservar a memória. Mas se é para fazê-lo às três pancadas e sem ânimo então mais vale estar quieto.

25
Set10

O impasse

jorge c.

José Sócrates é um homem desgastado. Aflito por não querer governar por duodécimos depende do PSD e de Passos Coelho. Por sua vez, o social-democrata está desejoso para ficar por cima e triunfar nas negociações. Para já, PPC age da mesma forma que agiu com Ferreira Leite: aceita a sua posição, diz não ter pressa de chegar ao poder, mas assim que pode mina o caminho com o seu jeito dissimulado.

Para o Primeiro-ministro governar sem poder exibir o seu reflexo não deve ser uma opção. Já sabíamos que Sócrates era um político menor com um ego grande, mas julgo que ninguém acreditou que se deixasse enfraquecer tão depressa. Portanto, o Chefe de Governo vive agora o impasse que também está a ser provocado pela Presidência e a redução dos poderes do Presidente devido às eleições que se aproximam.

No meio do bailarico, o cidadão comum não sabe o que há-de pensar e está naturalmente preocupado. De um lado dá-se a ideia de que o governo socialista esconde uma realidade negra e que estamos à beira do abismo. Do outro, fala-se numa conspiração contra Sócrates.

Para o staff e pseudo-staff dos partidos parece estar tudo bem na cavaqueira do costume de ataques pessoais e na desconversa do "olha que não sôtor, olhe que não". Contentes na sua posição de palermas, os aparelhistas de um lado e do outro divertem-se como se estivéssemos numa Batalha Naval, convencidos de que estão a salvar o país através de propaganda e contra-propaganda.

O impasse do Primeiro-ministro é, por isso mesmo, o nosso. Sócrates é o Primeiro-ministro e se calhar não seria mauzinho de todo, no meio daquilo que se anda a passar, que aparecesse só para dar um olá às tropas. Não sei se isto é pedir demais.

20
Set10

Ainda sobre a questão dos ciganos

jorge c.

"Felicito a vossa nação. Portugal dá o exemplo à Europa. Desfrutai de antemão essa imensa glória. A Europa imitará Portugal. Morte à morte! Guerra à guerra! Viva a vida! Ódio ao ódio. A liberdade é uma cidade imensa da qual todos somos concidadãos."

 

Victor Hugo, autor desta carta ao Parlamento Português a propósito da abolição da pena de morte em 1876, estaria hoje a procurar o livro de reclamações na recepção da Assembleia da República.

 

Devo esta memória a este post do Luís M. Jorge.

20
Set10

A pedagogia da crise

jorge c.

Li, hoje, no DN uma peça sobre o aumento da procura de casas para arrendar, em confronto com a procura de casa própria. A notícia fala de consequências da crise.

Não deixa de ser curioso que o tom nestas matérias seja sempre o da preocupação, um tom desgostoso, como se a adaptabilidade às circunstâncias, à conjuntura socio-económica, fosse uma calamidade e significasse por si só o fim do mundo em cuecas.

Parece-me que o país tem um problema sério em lidar com a adversidade. Viemos dando, ao longo dos anos, a nós mesmos, um estatuto qualquer que muitas vezes não corresponde às nossas reais potencialidades, sejam elas financeiras, profissionais, sociais e/ou culturais. A aquisição irreflectida de habitação própria através do crédito é apenas um símbolo de uma absoluta ilusão.

O melhor que a crise nos traz é o realismo. No meio da adversidade somos levados a reflectir e a questionar mais as nossas escolhas. Até a forma como olhamos o mercado de trabalho é diferente. É como se caísse um véu de aparências e passássemos a respeitar todos aqueles que ao nosso lado desempenham funções que, em tempo de vacas gordas, são ignoradas. A crise traz mesmo as profissões sem nome e cada um de nós está hoje mais preocupado em ter um emprego do que em ser qualquer coisa.

Artaud dizia que o teatro nasce da mais profunda das decadências, das crises civilizacionais. É também na adversidade e na necessidade que encontramos um sentido para as nossas vidas. O elemento pedagógico que delas advém torna-se fundamental para nos reconstruirmos com a solidez necessária. Encarar isto com o negativismo habitual não só não nos leva a lado algum, como nos faz ficar de mal com a vida.

19
Set10

Estereotipar por aí

jorge c.

A visita de Bento XVI a Londres despertou-me novamente para um assunto de relativa importância e ao qual julgo não se dar a devida atenção por parecer tão banal - a estereotipagem.

A grande maioria dos críticos da Igreja criou uma lógica de explicação de comportamentos ou práticas reprováveis. Assim, o abuso sexual de menores, por exemplo, explica-se através das restrições sexuais, para falar em termos abstractos. É uma lógica aflitiva. Consegue-se deste modo estereotipar toda uma religião. Este é também um dos motores do fanatismo que se diz combater - visualizar um inimigo compacto com certas características perfeitamente definidas. Um padre = um abusador. Um padre = um provocador de fanatismo. Um padre = um atentado contra a liberdade. Diga o que disser, primeiro funciona sempre a lógica que lhe será inculcada.

Mas a mesma história funciona para outras realidades. A estereotipia é, por si, uma arte. Repare-se na questão do abuso sexual de menores. Que imagem se faz de um abusador? O Luís M. Jorge, por exemplo, não teve dúvidas. Um abusador só pode ser um tipo de direita, gordinho e oleoso, um canastrão empresário, um porco da classe média, ignorante da filosofia e da poesia mas mestre em futebol, tremoços e charutos rascas. Ou então, como relatava um jornalista do Diário de Notícias aquando do julgamento da Casa Pia, o feliz proprietário de um "carro de alta cilindrada" que, segundo os mais informados, parecem ser os únicos a passear-se lentamente pelo Parque Eduardo VII - o único sítio onde existe, aliás, prostituição masculina em todo o mundo - ou seja, gente de posses e mal resolvida com o seu machismo e por aí em diante. Deus! Metade do país é um abusador sexual de menores.

A questão da estereotipagem tem, para mim, a ver com insegurança e medo. Dar ao que não compreendemos uma cara será sempre mais fácil. Criar um inimigo físico com características específicas faz muito mais sentido para uma certa fragilidade da nossa personalidade. Foi isso mesmo que Vincenzo Natali mostrou em Nothing (2003), onde duas criaturas perseguidas pela sua própria vida e pelas suas vicissitudes começam a apagar pessoas e situações só com o poder da vontade até restarem apenas as suas cabeças. Só as suas cabeças.

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