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Manual de maus costumes

Manual de maus costumes

22
Mai11

A crise da ironia

jorge c.

Acordam-me de manhã: "apareceste na televisão". O pânico. Não é algo de que uma pessoa se possa orgulhar, principalmente a um Sábado de manhã. Nunca se sabe o ponto a que chegou a noite de Sexta. Mas desta tinha a certeza: fiquei em casa. Vasculhei e descobri que afinal tinha sido um tweet meu a ser exposto em praça pública. E perguntam vocês: o que é um tweet? Ainda bem que perguntam. Devemos sempre perguntar quando não sabemos. Um tweet é um micro post-it do Twitter - uma rede social simples, rápida e directa onde se escreve apenas em 140 caracteres. Mas não basta isto. Com o tempo percebemos que não só podemos tuitar, como podemos retuitar (uma espécie de citação) e responder a todos os que seguimos e àqueles que nos seguem (ao contrário do Facebook, no Twitter não é necessária reciprocidade). Bastarão - digamos - uns dias para entrar dentro da coisa e perceber o seu funcionamento, alguns dos seus truques e a sua dinâmica. Para tudo na vida é necessário algum enquadramento.

Acontece que ontem, durante as notícias da manhã, Daniel Catalão, como já vai sendo hábito, foi mostrando algumas das reacções das redes sociais ao debate entre Passos Coelho e Sócrates. Os media tradicionais adoram ver o que se passa nas redes sociais quase tanto como eu adoro livros. É uma preocupação que quase chega a parecer genuína e comovente. E tal como podemos ver aqui, aos 22 minutos, lá apareceu este vosso camarada citado por Daniel Catalão como se tivesse sido o autor do tweet "vencedor do debate não sei. mas quem perdeu sei bem: portugal". Ora, como será bom de verificar não fui eu que disse isso, mas sim a tuiteira @NadiaMelk como fica bem visível no vosso ecrã. O que eu fiz foi um RT, ou seja, um retuíte; eu citei a @NadiaMelk fazendo um pequeno comentário antes.

Nesse meu pequeno comentário, parece ser mais ou menos evidente que estou a ser um bocadinho parvo. Bem sei que não sou muito hábil na utilização de figuras de estilo, e aquilo que pode não ter parecido uma tentativa cobarde de não ofender a minha amiga devido à utilização absurda de um lugar comum despropositado é, de facto, uma reles ironia. Julguei que fosse mais ou menos evidente.

Os media tradicionais querem usar as redes sociais a todo o custo. Eu compreendo que não seja por mal. É aquela velha euforia do empresário português "agora é isto que está a dar". Ah, a modernidade! Convém, pelo menos, que saibam o que estão a fazer e que não façam o meu pai (que assistiu a tudo isto, meu Deus) ter quase um colapso a acreditar que eu teria algum dia dito que "portugal tinha ficado a perder" como se diz nos funerais das estrelas da Emissora Nacional.

Não quero com isto ser mal agradecido. Eu adoro ser famoso e agradeço a atenção. É um sonho de criança.

22
Mai11

O costume

jorge c.

A inexistência de um único vinho da Sogrape nesta peça é reveladora de duas coisas: preconceito e ignorância arrogante. Durante anos, em Portugal, o hiato entre os vinhos caros e os vinhos baratos era o mesmo entre os bons e os maus e era profundo. Empresas como a Sogrape equilibraram o mercado e apresentaram vinhos bem feitos e competentes a preços acessíveis. Pela primeira vez, e só aí por meados dos anos 90 ou até mais tarde, é que se começou a falar do conceito de "relação qualidade/preço" porque só empresas grandes tinham uma mentalidade mais evoluída e não tão familiar. O alentejano deixa de ser o vinho de eleição nas jantaradas da rapaziada ("olha uma de Monte Velho, que pomada!") e o Douro começa a entrar e a tomar território. Por causa dos vinhos que estão naquela lista? Não, por causa do Esteva.

Muito mais haveria para dizer sobre esse preconceito. Até com vinhos de topo isto acontece. Temos má crítica de vinhos, um mercado desconhecedor (a mudar, é certo) e excessivamente influenciável. Temos uma cultura vinícola fraca e queiroziana - superficial e fútil. As revistas de vinhos são pagas para destacar certas marcas e quem não o faz não entra. Os retalhistas ou não pagam ou competem a preços inadmissíveis, negociando muitas vezes abaixo do preço de custo e interferindo desse modo na concorrência directa do produto. Tudo isto é relevante para nós, consumidores. Mas o Fugas do Público prefere fazer artigos parciais. Já estamos habituados. É o costume.

 

 

Nota: Este post é escrito com um disclaimer já que o seu autor tem uma relação próxima com a Sogrape. Era só para avisar.

21
Mai11

Coisas realmente importantes

jorge c.

"Ponto primeiro: nós, com esta política de concorrência não vamos a lado nenhum. O PSD não abre a boca sobre o assunto. Nós, com esta autoridade de concorrência, não conseguimos garantir condições para uma política de concorrência sã, não conseguimos garantir que players novos entrem nos mercados..."

 

Paulo Portas, hoje, em entrevista à Única (sem link)

20
Mai11

Adoro livros

jorge c.

No entanto, não os posso ler a todos porque tenho de encontrar tempo para a modernidade no meio disto tudo. Alguém precisa de se preocupar com o progresso. Daí que seria para mim impossível ajuizar da melhor forma todos os requisitos para atribuir um prémio como o Man Booker que se foca não apenas num único manual de inscrição na vida, mas sim num conjunto de obras na obra do autor. Não quero, no entanto, deixar de concordar histericamente com a atribuição do Man Booker 2011 a Philip Roth.

Não obstante acreditar que Roth é o melhor escritor vivo e para isso - vou fazer agora de Clara Ferreira Alves - bastar-lhe-ia ter escrito a Pastoral Americana e a Mancha Humana, o autor tem sido injustiçado numa série de prémios. Posso ser suspeito. Sou, mas isso agora não interessa nada porque é mesmo disso que vou acusar os outros.

Podemos ler aqui que um dos júris demitiu-se depois da atribuição do prémio a Roth. Uma mulher, pois então, por que será? A Sra. Callil não só acha que o assunto é sempre o mesmo (cenas de homem) como também é muito possível que não goste efectivamente do autor. Não deixa de ser giro. No outro dia, alguém desatou aos gritos contra a misoginia e o machismo de Vinicius de Moraes (nascido em 1913, já agora, num país tropical da América Latina), coisas que desgraçam logo toda a obra de um autor, que horror! Este pensamento pertence a quem não valoriza a literatura, a quem não quer saber da literatura, tendo apenas uma agenda demasiado pessoal (totalmente legítima, diga-se) incapaz de reconhecer a beleza ou a genialidade do que se lhe apresenta escrito. Coisas que respeito num ambiente próximo do miradouro da Graça, onde gosto de falar de poesia sem comprometimentos.

Quanto ao tema ser o mesmo... Quer dizer, como diz o meu amigo João Gaspar sempre que vemos um filme: "isto era sobre a condição humana". No limite, tudo é sobre a condição humana e esse será sempre o tema de eleição da maioria dos autores. A beleza de cada obra está na forma como o autor explora essa condição e nisso Roth foi sendo sublime, mesmo que a espaços.

19
Mai11

Home

jorge c.

Em Grande Hotel, de Lotte Stoops, Berta, a mulher que podemos ver e ouvir logo no início do trailer, diz-nos que se "saudade" é uma palavra exclusivamente portuguesa, então "home" será uma palavra exclusivamente inglesa. Nenhuma palavra pode descrever o significado de "home": esse lugar onde nos sentimos confortáveis, cúmplices e parte integrante; esse lugar onde a linguagem é inteligível, onde nos entendemos e onde somos naturalmente solidários.

Para Berta, não foi regressar a Portugal, mas deixar esse útero e chegar a um sítio estranho. Apesar de não o compreender, passados tantos anos, sabe que não há outra solução. Mas não lhe peçam para aceitar e fazer de conta que é forte e que está tudo bem. Longe dessa casa nunca se estará totalmente bem, mesmo que qualquer tábua sirva de cama.

 

19
Mai11

A forma errada de fazer campanha

jorge c.

Com seis anos de governação tomam-se muitas decisões, sendo que muitas delas não coincidem com o programa original, outras contrariam posições assumidas anteriormente e outras tantas desafiam até a natureza ideológica dos partidos. Podemos não ver isto como uma incoerência inadmissível, mas antes como real politik ou mera movimentação social.

A verdade é que basear uma campanha eleitoral nas contradições e erros dos outros pode ser uma estratégia contraproducente devido a esses tais seis anos de decisões, ou mais, em alguns casos. Para além do vazio discursivo, o tiro pode sempre sair pela culatra e depois é uma maçada.

18
Mai11

Igualdade de Oportunidades

jorge c.

O tema da semana são as Novas Oportunidades (NO) e, como não poderia deixar de ser, a defesa do programa passa por dados estatísticos e o sucesso avaliado por uma auditoria monotorizada pelo saudosíssimo Dr. Roberto Carneiro. A vida tem destas pequenas ironias.

A minha questão com as NO não é nem a sua intenção, nem o sucesso que parece ter entre os seus formandos e formados. É perfeitamente natural que se olhe para esta oportunidade de aumentar as habilitações literárias com bastante entusiasmo. Acho isso óptimo. A verdade é que o modo como o programa é executado suscita-me dúvidas. Vejamos, então, as declarações do tal Dr. Carneiro aqui.

Não obstante a satisfação pela oportunidade que lhes é concedida, não podemos passar uma esponja nas diferenças académicas entre estas pessoas e as que fizeram o percurso curricular comum. Não será de todo justo que seja atribuída a mesma habilitação a uns e outros. Parece-me lógico.

É neste sentido que corre a crítica ao programa em causa. E, ao contrário do que diz o Pedro Marques Lopes, não acho que seja um caso de sucesso em sentido amplo, mas sim em sentido muito restrito - o das estatísticas. Sim, um achismo, porque a política também é a nossa convicção sobre as matérias, aquilo que acreditamos ser ou não ser um caminho certo para um objectivo comum, neste caso a igualdade de oportunidades.

 

Adenda: "A avaliação externa do programa Novas Oportunidades não contemplou, até hoje, uma aferição directa da qualidade da formação ministrada no âmbito desta iniciativa, que, em seis anos, permitiu a certificação de 520 mil pessoas com diplomas do 4.º, 9.º e 12.º anos, confirmou ao PÚBLICO o investigador Joaquim Azevedo, um dos peritos que têm acompanhado o trabalho de avaliação iniciado em 2008." (sublinhados meus)

18
Mai11

A Turista - let england shake

jorge c.

Se o Reino Unido (RU) é o Estado-membro da UE mais sui generis, então esta visita da Rainha é particularmente interessante para toda a União, não só pela paz social, como também pela narrativa do RU para o futuro em relação a tudo o resto - à sua relação com os outros.

Não deixam de ser apenas dois dias de visita oficial para já (100 anos depois), mas já deu para perceber que não passará muito deste registo turístico e paternalista, diria, até. Quatro dias ao todo de uma visita que se esperava mais relevante e expressiva. Por isso não deixa de ser curioso este artigo no Belfast Telegraph, por Charles Lysaght, que mostra a simpatia que os irlandeses têm por Elizabeth e o desprezo - quando não raiva - pela Coroa que representa.

Portanto, cingindo-me ao que diz Lysaght para os irlandeses seria mais simpático uma visita a título pessoal da Rainha (causal, de ténis, quem sabe) do que uma visita oficial que pode não ter qualquer impacto numa solução histórica e é completamente fútil, vindo apenas agravar tensões que têm desaparecido em grande escala, com o tempo. O autor sugere ainda que esta visita deveria ser acompanhada de uma cedência britânica para que marcasse efectivamente um papel na História, e não este passeio de turista oficial, de traje clássico, como se o tempo tivesse parado 100 anos e a Coroa viesse ver as terras.

 

 

 

"until the day is ending, 
& the birds are silent in the branches, 
& the insects are courting in the bushes, 
& by the shores of lovely lakes 
heavy stones are falling."

 

pj harvey

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