Um problema de carácter
Se a opinião pública serve para os governos e restantes partidos poderem formular o seu programa imediato, ela nunca pode servir como barómetro de nada. A opinião pública é, em regra, parcial, egoísta e despropositada. Tem-se visto isso mesmo em relação aos problemas que envolvem a Justiça. De repente temos milhares de especialistas em magistraturas. O que não temos, e deveríamos ter, é noção do ridículo e da ignorância. Podíamos perfeitamente colocar a questão deste modo: os portugueses combatem a sua própria ignorância com o ridículo.
Um dos vícios mais comuns da opinião pública é a descredibilização. Imagine-se uma figura de menor relevância que escreve num jornal. Durante determinado período de tempo, comentou sobre certa matéria, sendo que a sua opinião era favorável a um grupo e desfavorável a outro. O que é que faz a opinião pública? Há sempre alguém que conhece alguém. Há sempre alguém que conhece um especialista naquela matéria e que, por conseguinte, aquela pessoa não acerta uma e só diz mentiras. É, aliás, público que ela se transforma em Liliana Romanoff ou que come criancinhas ao pequeno almoço.
É sabido que a democracia é imatura, que os portugueses têm muita dificuldade em lidar com a opinião contrária sem fazer juízos de valor, subjectivos. É sabido que a parcialidade política é muito mais emocional do que ideológica, que a grande maioria dos portugueses desconhece profundamente a raiz e a evolução da sua ideologia política e que, em rigor, há pouca gente a discernir entre os elementos técnicos e os elementos políticos dos assuntos. O problema é que essa imaturidade ofende, é imoral. Dir-se-ia que a opinião pública é mal formada.