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Manual de maus costumes

Manual de maus costumes

19
Jun11

Publicidade, comunicação e concorrência

jorge c.

Acho que nunca discordei do Paulo. Mas há sempre uma primeira vez. O Paulo é o génio da sensatez. Aprendo sempre que ele escreve e muitas vezes aqui me denunciei. Acontece que desta vez não consigo encontrar uma linha de convergência, mesmo que, porém, não possa dizer que discordo. Assumo, assim, que pretendo discutir, tendo a consciência que posso não estar a ver totalmente a fotografia (the big picture, como se diz no estrangeiro), tentarei ser breve expondo a minha perspectiva.

Segundo compreendi, o Paulo não acha correcto que um jornal subverta o sentido da publicidade transformando-a em notícia. Estaremos todos de acordo. É uma regra. Não falaremos, por ora, do dogma. Também não falaremos já de outras questões de concorrência que poderão ser mais ou menos relevantes. Não concordo que se compare o incomparável, muito embora estas questões, e de uma forma pragmática, se possam considerar relevantes. Vamos à questão de princípio.

O objectivo desta rubrica é, pelo que nos é dado a entender, explorar a dimensão da marca portuguesa num sentido amplo. Para tal utilizam o formato da entrevista de uma personalidade, dir-se-ia insuspeita. Temos aqui 3 factores: uma entrevista, uma personalidade e uma marca. Temos como evidente (por uma questão de princípio) que um formato jornalístico está a ser usado para publicitar (sentido amplo) uma ou várias marcas (poderíamos dizer produtos ou empresas). Também por uma questão de princípio, e a olho nu, achamos que aqui existe a tal subversão de que falávamos. As coisas confundem-se e geram confusão. Até aqui, de acordo.

A entrevista tem um contexto que é a rubrica. A personalidade aceita. A marca promove-se. Facto. Também será facto a marca não se deixar apenas promover. Vamos então a um ponto fundamental que deixámos lá atrás. A marca faz-se promover. Será isto um problema de concorrência e igualdade de oportunidades ou igualdade de tratamento nos meios de comunicação?

Todos temos, hoje, noção que as marcas ou certas entidades se promovem através da comunicação que é produzida por agências especializadas nos media. Estas companhias têm um âmbito de negócio baseado na influência. Sabemos que um conjunto significativo de notícias é produzido por estas, seja a sua temátia política, económica, cultural, outra, não sabe/não responde.

Tudo o que é marca deseja promover-se. Essa promoção não parte única e exclusivamente da perspectiva comercial, apesar de ser este o seu ponto de partida e, fudamentalmente, a sua finalidade (o lucro, para sermos mais exactos, e nada contra, pelo menos daqui de onde vos escrevo com amor). Ela pode partir, também, de uma necessidade de divulgar características fundamentais ao bem comum. Coloca-se, aqui, antes, a questão do acesso aos meios. Uma empresa familiar não terá os mesmos meios que a Jerónimo Martins ou a Sonae, no sentido em que as vantagens que apresentam são, em quase tudo, semelhantes. O interesse noticioso não poderá ser diferente. Acontece que o crescimento económico de determinada empresa fá-la ter capital para comprar um serviço de influência, não o meio de comunicação em si. Podemos, portanto, estar a falar de uma concorrtência desleal por factores de monopólio.

Contudo, acredito que antes deste ponto existem outros factores de monopólio e consequente deslealdade de concorrência mais influentes no comportamento do consumidor, como sejam os preços e o seu tratamento. Nada disto implica que não se tenha um tratamento noticioso equivalente. Acontece apenas que um media tem o direito de ser influenciado. E aqui não estamos na orla da publicidade, mas sim da influência.

Poderia ter resumido tudo isto ao seguinte: a comunicação de uma característica comercial não é obrigatoriamente publicidade. A publicidade é paga. Haverá mecanismos para investigar sobre a legalidade desta comunicação que aparenta publicidade. Poderíamos até considerar que estamos perante publicidade indirecta. No entanto, teríamos de questionar antes a legitimidade das agências de comunicação que promovem e influenciam junto dos órgãos de comunicação os seus clientes. Clientes que pagam para ter eficácia comercial.

Este é um tema de discussão e não de impulsão. Reforço, agora, a problemática do dogma. Em Portugal temos uma linguagem assumidamente dogmática em relação às entidades privadas. Encaramo-las como monstros subversivos. Mas, esquecemos que muito do seu sucesso passa por despender recursos para conseguir 5 minutos de atenção. Não questionamos a companhia de teatro ou o dirigente partidário que tem um amigo próximo numa redacção, mas iremos certamente questionar o capitalista que tenta influenciar, só porque tem um capital evidente. Tudo é mera influência.

Como se diria nos meandros do Direito: Quid iuris?

 

29
Dez10

O futuro da história

jorge c.

 

O Diário de Notícias faz hoje 146 anos. A data é assinalada com uma edição especial em que Gonçalo M. Tavares é o director convidado. Hoje, comemora-se mais a longevidade do jornal do que a sua relevância no panorama da comunicação. À parte de alguns exclusivos (as entrevistas ao PM e uma polémica publicação de e-mails de outros jornalistas no caso das fantasmagóricas escutas de Belém), o DN perdeu aquela magnitude tão presente no seu edifício da Av. Liberdade. Foi-se conformando, ao longo dos anos, ao seu papel de jornal do regime, do bloco central, do interesse instalado e dos joguinhos medíocres dos bastidores do poder. O jornal conta com bons jornalistas, com bons cronistas, mas a sua direcção parece fraca demais para o seu passado histórico. Sabemos que o grupo Controlinveste tem um objectivo legítimo de negócio. Mas também devemos saber impor aquilo que pretendemos dos meios de comunicação e ser mais críticos com as suas fragilidades.

Contudo, este ano recuperou parte da sua história com o Media Lab, levando milhares de crianças às suas instalações num projecto que tem mais de pedagógico do que marketeiro. Um jornal que coleccionou no seu passado um conjunto de benfeitorias não se pode furtar à sua função social e cultural.

A grande dificuldade dos media por esta altura é o futuro do formato. É sabido que o papel tem perdido procura e os conteúdos online continuam abertos. Mas, não nos podemos esquecer que isto é um negócio e que, se queremos qualidade no serviço de informação, com todas as particularidades que isso envolve, temos que pagar. Talvez este fosse um bom tema para o DN levantar este ano junto dos leitores, começando por mostrar que o interesse principal é manter o nível de informação online bem alto e começar a preparar uma estrutura de futuro, e não apenas ganhar dinheiro. Até porque terá que explicar que fechar os seus conteúdos não faria sentido numa comunidade habituada ao gratuito. Portanto, numa lógica de interesse público os jornais têm de se fazer pagar e os leitores têm de suportar a qualidade da informação que exigem. Ou será que não exigem nada?

29
Dez10

É a comunicação, estúpido

jorge c.

Há umas semanas assisti à entrega anual dos prémios do Instituto de Negociação e Venda (INV). Nessa cerimónia falou-se muito de tendências do consumidor. Também se falou muito de internet, como uma novidade que anda por aí. Acredito que para a grande parte dos empresários que se encontravam na sala a internet seja mesmo uma novidade. Não é de espantar da parte de quem vê no consumidor uma tendência.

Durante anos, as empresas habituaram-se a tratar os consumidores como cobaias de marketing e só muito recentemente decidiram apostar na qualidade dos serviços. Parece que o consumidor descobriu-lhes a careca. Mas, para esta nova tarefa é preciso estar na internet. Ora, estar na internet não deverá ser um processo muito simples para quem acordou para ela em 2010.

O investimento na comunicação tornou-se uma necessidade das empresas numa altura em que a velocidade de informação ultrapassou o impacto da televisão e dos placards de rua. A prática de muitas dessas empresas não tem resultado. Aproveitaram os departamentos de informática para tratar dos assuntos de internet. Lembra um pouco aquela história dos professores de Electrotecnia serem destacados para dar aulas de Matemática. É que por mais que percebam os seus meandros, é preciso compreender que os assuntos da internet são assuntos de comunicação e não de informática. Eu posso ter uma página toda catita e a sua eficácia ser praticamente nula. Os conteúdos da minha página é que são relevantes; as linhas de comunicação internas é que são importantes; o contacto exterior com os consumidores é que é importante. Tudo o resto é modernização serôdia que parte essencialmente da ignorância.

Se ao invés de desconfiar procurassem e se informassem sobre um universo com o qual não estão familiarizados, muitas das empresas estariam hoje com uma imagem muito positiva perante os consumidores. Nem precisariam de andar com conversas de marketing que cheiram a mofo.

Os clientes são pessoas e as pessoas querem ser tratadas como tal. Isto não é uma tendência, é puro bom senso.

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