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Manual de maus costumes

Manual de maus costumes

16
Jan14

o lobo de jeddah

jorge c.

Um ex-treinador do Futebol Clube do Porto, Vitor Pereira, foi protagonista de um episódio muito curioso, após um jogo do clube que agora treina na Arábia Saudita, em que se viu perante uma tentativa de condicionamento das suas declarações no final da partida. Para além do descontrolo e do inglês caricaturável, captou-me mais o interesse uma frase dita pelo próprio, de forma muito espontânea e convicta - selvagem, diria. Confrontando o seu censor, em directo na sala de imprensa, Vitor Pereira, exaltado, exigiu dizer aquilo que achava e não o que queriam que ele dissesse, afirmando que "isto é um país livre". O país a que Pereira se refere é a Arábia Saudita, uma monarquia islâmica absolutista, cuja lei fundamental é o AlCorão e a criminal a Sharia. Então, qual a razão da frase impulsiva do treinador português? Talvez seja um pouco revelador da percepção da realidade de que vivem os homens do mundo do futebol. É um universo paralelo onde as regras comuns entre os mortais parecem não ter lugar; um mercado livre de tráfico de capitais e pessoas; um buraco negro de difamção, injúria e violência. Para Pereira, a liberdade de expressão ultrapassa as fronteiras da sociedade em que cresceu porque o futebol lhe permite isso, porque a lei a que obedece é a do futebol que conhece. Poderíamos concluir que é essa a grande obra do futebol para a humanidade - o universalismo ou a globalização em estado bruto. Mas não é. É, antes, um sinal preocupante de alienação e, se quisermos, levando para outros campeonatos, de alguma impunidade, perante a nossa condescendência. Se Jeddah fosse Wall Street, Vitor Pereira seria Jordan Belfort, o seu mais inconsciente lobo.

02
Out11

Alerta amarelo

jorge c.

Há quase um mês, os sportinguistas, nas suas lamúrias, andavam desmotivados com o treinador e com os jogadores. Domingos não parecia agradar. Há uma semana, Vitor Pereira já ouvia o zumbido do despedimento da bancada do Dragão. A escolha de Pinto da Costa era questionada. Ontem, Luís Filipe Vieira defendeu Vitor Pereira e mandou um recado a Jorge Jesus.

E eu ainda falo no non sense da política.

04
Abr11

A espuma dos dias

jorge c.

Este é um título gasto. Não vou abusar pornograficamente dele. Até porque a espuma dos dias que correm lembra as marés poluídas reproduzidas nos livros da escola instruindo-nos para um planeta melhor. Sejam bons meninos, não deitem lixo para o chão, não liguem o sistema de rega quando não é nesserário e todas essas recomendações que julgamos que todos apreenderam da mesma maneira. Duas pessoas de boa fé com a mesma informação blábláblá vocês sabem o resto. A escola ensina-nos o pensamento abstracto, desde a nossa relação com o meio físico e social até à matemática, relacionando as duas ao ponto de percebermos que 2-1 pode não ser 1 e ser mesmo dois um, algo que temos de aceitar no sentido de sairmos ridicularizados, mesmo na nossa própria casa e então sejam bons meninos, não deitem lixo para o chão, não liguem o sistema de rega, nem apaguem as luzes para as voltar a acender logo depois porque o gasto de energia é maior. Coisas simples, lógicas, para uma convivência saudável tout court. Mas parece que a equação das duas pessoas de boa fé com a mesma informação blábláblá vocês sabem o resto não tem o resultado esperado. Aquilo que define as pessoas não é o que elas aprendem, mas a forma como o usam, o seu carácter e todas essas características que inevitavelmente acabamos todos por ter em excesso no dia em que vamos ao encontro do criador; um currículo sobrevalorizado pelos nossos pares e que nem sempre tem assento parlamentar. Senhor deputado, tem a palavra. E já que ma dão, que expressão tão bonita, queria aproveitar para agradecer à minha família e a todos os que contribuíram para este momento em que me apercebo mais uma vez que a espuma dos dias é a revelação de que nem sempre o pensamento abstracto que nos ensinam a todos na escola, a nossa relação matemática com o meio físico e social a partir da comunicação gramática, a nossa memória histórica imputada, resultam no mesmo e acabamos por usar os instrumentos que temos de forma despropositada, desadequada, mesquinha, pequena. Foram conselhos que não ouvimos, aulas a que faltámos, confusões de conceitos, sabe-se lá o que é que acontece a uma criança quando está sozinha. É por isso que lhes dizemos sempre sejam amigos, sejam bons meninos, não deitem lixo para o chão, não liguem o sistema de rega, nem apaguem as luzes para as voltar a acender logo depois porque o gasto de energia é maior, não mintam a ninguém, nem mesmo a vocês próprios, valores em escala que julgamos apreendidos. É lançá-las no mundo para serem pessoas melhores para elas próprias, sem ressentimento, sem rancor. E quando é preciso que um acontecimento mediático e evidente nos prove isso, quando achamos que isso vai nos tornar a todos em criaturas mais conscienciosas, regressa o ódio e o cheiro da vingança como lixo das fossas que desembocavam na praia de Matosinhos quando eu tinha doze anos, e ali ficava uma espuma escura, colorida mas escura. Era impossível que parecesse bem a alguém.

15
Fev11

O Fenómeno

jorge c.

"É urubu e é otário - quem tem Ronaldo não precisa de Romário". Era assim que se cantava quando Scolari resolveu deixar o baixinho em casa. Romário, que encheu estádios para o verem de perna puxada atrás a receber a bola com a parte de fora do pé, para depois contornar o adversário e empurrar lá para dentro com a mesma arrogância elegante com que depois abria os braços e de mão no peito mostrava que era do tamanho da sua arte. Mas este já não era o tempo de Romário.

Guardiola, Stoichkov, Figo e o novo fenómeno destruía a defesa do Valência em 4 dribles para depois, como sempre, encostá-la lá bem rente ao poste. Veloz, partia como um míssil para cima dos adversários. O bailado de Ronaldo, sustentado pela poesia dos seus pés numa série de vírgulas que separavam os movimentos ostensivos do seu corpo, era agora a paixão do mundo. Veloz e belo, Ronaldo, fazia-me esquecer Romário e eu gritava golo - do PSV, do Barça, do Milan, do Real... até do Inter - e ele sorria como um menino que não parava de se deslumbrar consigo mesmo. Até ao dia em que de olhos inundados de tristeza disse adeus e o mesmo mundo deu-lhe 3 minutos de atenção.

 

 

Leitura obrigatória: este post absolutamente maravilhoso.

14
Fev11

Naturalizar

jorge c.

Como todas as leis, a da Nacionalidade foi-se modificando. A transformação das realidades sociais e culturais em democracia impõe sempre uma modificação da matéria da lei porque o contrário seria estrangular uma sociedade que não reflecte aquela realidade constitucional.

A Naturalização é uma dessas matérias que foi sendo alterada e, hoje, diz-nos o art. 6ª da Lei 37/81:

1- O Governo pode conceder a nacionalidade portuguesa, por naturalização, aos estrangeiros que satisfaçam cumulativamente os seguintes requisitos:

 

a) Serem maiores ou emancipados à face da lei portuguesa;

b) Residirem há seis anos, pelo menos, em território português ou sob administração portuguesa;

c) Conhecerem suficientemente a língua portuguesa;

d) Terem idoneidade moral e civil;

e) Possuírem capacidade para reger a sua pessoa e assegurar a sua subsistência.

Este comentário de Paulo Bento, portanto, não é xenófobo, é apenas ignorante. Não é preciso fazer um grande drama à volta disto. Mas podemos ser um bocadinho pedagógicos e explicar ao Paulo Bento que, em primeiro lugar, não é ele nem nenhuma instituição desportiva que decide se um cidadão se deve ou não naturalizar. Essa escolha cabe a cada indivíduo e a decisão ao Estado. A única coisa em que Paulo Bento manda é nas suas convocatórias.

Acontece que se Paulo Bento voltar a fazer afirmações destas e depois não convocar jogadores naturalizados pode perfeitamente estar a incorrer em discriminação e a violar a Constituição.

Este é um problema comum na maioria dos portugueses que pensa a naturalização do futebol fora da esfera jurídico-constitucional. Não há nem pode haver excepções. A questão da naturalização é única e exclusivamente do âmbito jurídico.

21
Jun10

Breves notas sobre o mundial de futebol

jorge c.

Estou de férias e sem grande vontade de ver futebol. Há apenas algumas coisas que me irritam profundamente na febre do mundial.

Em primeiro lugar, irrita-me que apareça tanta gente a falar do que não sabe, começando pelos jornalistas que tendem a fazer comentários sobre o jogo e para os quais não têm o mínimo de conhecimento. No twitter, o inenarrável e ridículo Nuno Luz, jornalista (ninguém sabe como) da Sic, dizia no início do jogo da selecção nacional que faltava ali alguém para fazer a transposição de jogo. Portugal ganha por 7 - 0 e toda a gente percebe que o Nuno Luz só disse aquilo porque lhe pareceu lógico que o facto de Deco estar no banco iria gerar logo esse problema. Esta amiba nem se deu ao trabalho de ver o jogo. Se calhar até viu, mas não sabe. Não sabe do que fala, não percebe o jogo e só diz banalidades. O problema é que estas banalidades estão a entrar por nossa casa durante todo o dia, a todos os minutos.

Há um caso curioso. Cristiano Ronaldo disse um disparate qualquer sobre golos e ketchup. Uma parvoice que o Cristiano Ronaldo diz porque a cena dele é jogar futebol, o que faz muito bem. No entanto, parece-me é grave que, a seguir a isso, a opinião pública desate a repetir o disparate, sabendo que é um disparate mas não tendo capacidade para lhe retirar esse efeito.

Em suma, o que a febre do mundial faz é despertar a futilidade adormecida na sombra dos dias. Trata-se de um holofote para a imbecilidade ao som de vuvuzelas.

 

Uma última nota apenas sobre um comentário de Hélder Conduto durante o jogo na RTP. Diz o jornalista que a Coreia estava muito atrevida. Repetiu-se duante a semana "a desconhecida Coreia do Norte". Não se compreende como é que um jornalista, cuja função é pesquisar e estar atento, diga uma coisa destas de uma selecção que está na fase final de um mundial. Não viu os jogos da Coreia? Porquê? É desconhecida por causa da ignorância e da falta de trabalho?

 

Ah, e já me esquecia que esta mania do David e Golias é perturbante para quem vê futebol o ano inteiro. Passa-se um mundial inteiro a querer que os grandes percam? Porquê? Os grandes ganham e são grandes por causa disso. Esta mania de politizar o futebol (e vice-versa) é coisa de gente ignorante e que, no fundo, não gosta de desporto. Gosta de dizer disparates porque tem uma vidinha miserável e nada melhor que chatear a cabeça de quem gosta disto a sério.

 

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