É a cultura, estúpido, a cultura da economia
O problema fundamental deste Governo, e já aqui o disse diversas vezes, é a falta de cultura. Mesmo dentro da inexperiência, a cultura (seja de mercado, seja social, política, democrática) ajuda a que as decisões sejam tomadas dentro daquilo que é a sensatez e a harmonia social. Numa democracia, digo. Numa democracia, a cultura política é fundamental.
Quando olhamos para a proposta de alteração do Código Laboral e vemos que uma das ideias peregrinas é retirar a indemnização por despedimento aos contratados a termo certo e a necessidade de aviso prévio, percebemos o nível de desconhecimento que este Governo tem da forma como funciona o mercado de trabalho em Portugal.
Dito de outra forma, existe hoje uma opinião generalizada - e, a meu ver, correcta - que a classe empresarial portuguesa sofreu durante décadas de bastantes fragilidades. Como em tudo, as coisas evoluem. Mas, tendo em conta que o tecido empresarial português se faz, sobretudo, de pequenas e médias empresas, é de crer que a cultura de melhores práticas a nível de recursos humanos não seja das mais evoluídas. Quer isto dizer que a probilidade de criar um sentimento geral de precariedade nos contratos a termo é bastante elevada.
Para que um trabalhador consiga gerir a sua vida profissional e tenha noção da sua continuidade numa empresa, é necessário que as chefias e os recursos humanos desenvolvam uma política de acompanhamento forte e consistente do seu desempenho; é necessário que haja vontade de melhorar as fragilidades e competências do trabalhador. Se isto não acontece, deixamos o trabalhador desamparado e incorre-se num enorme risco de injustiça laboral.
Posto isto, retirar a indemnização e a necessidade de aviso prévio, ao mesmo tempo, é uma proposta desadequada e insensata. Poder-se-ia optar pela manutenção da indemnização em caso de não existir aviso prévio. Prefere-se, contudo, arriscar a porta aberta ao despedimento e ao aumento de contratos desta natureza pela facilidade com que podem ser terminados.
O sentimento generalizado de precariedade em contratos a termo certo não é benéfico para as empresas, visto que aumenta a insegurança no trabalhador e pode ser contraproducente, no sentido em que o desempenho, o comprometimento e o cumprimento de objectivos podem estar sob ameaça. É natural que assim seja. A função da lei é prever que o empregador pode não estar de boa-fé e, portanto, zelar pelo interesse geral. Com uma taxa de desemprego nos 15%, parece-me óbvio que o interesse geral é combater o desemprego e não alimentá-lo.
É um tema delicado, é certo. Há reformas que têm de ser feitas. Mas, para isso, é preciso cultura.