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Manual de maus costumes

Manual de maus costumes

22
Jan14

das elites

jorge c.

Este interessante texto ilustrativo de uma determinada realidade levou-me a outra matéria, mais abstracta, sobre a qual venho a pensar há algum tempo. O texto foca-se numa circunstância muito localizada. Fala-nos de uma elite lisboeta que nasce de uma perspectiva ideológica e/ou político-partidária. Algo muito específico. A ideia que isso me provoca é outra, mais ampla. 

Não sei definir o nascimento de uma elite. Haverá, certamente, um elemento identitário, depois um elemento mobilizador e uma liderança. Com o tempo, passa a existir apenas uma massa mais ou menos compacta e fechada em si mesma. O que me leva aqui à forma inconsequente e onanista da formação das elites, do seu carácter intrinsecamente fútil. Mas será que quando falamos de elite falamos do seu significado original ou estamos apenas a referir-nos a grupos elitistas? Sem possibilidade de consultar a outro dicionário, recorro ao Priberam e encontro, numa das definições, a minha resposta: "Minoria social que se considera prestigiosa e que por isso detém algum poder e influência". É a esta definição que me vou referir. 

O prestígio é um elemento exclusivamente psicológico. Significa isto que é instalado na percepção das pessoas e funciona como um vírus, não derivando de razões práticas muito concretas ou, até, de virtudes específicas. Neste campo de abstracção, surge um espaço para um desejo de pertença meramente estético e que vai criar uma marca influenciadora. É este espaço que dará a ideia de prestígio. 

Podemos observar algumas das elites que se espalham pelo país, umas mais compreensíveis do que outras: a elite política urbano-burguesa lisboeta, bem descrita no texto de António Araújo quando este se refere à mistura ideológica em determinado contexto social; a elite académica de Coimbra e de Lisboa; a elite burguesa portuense da Foz e da Boavista; a elite empresarial de Braga ou de Aveiro; a elite aristocrata do Ribatejo; a elite proprietária alentejana. Todas estas realidades minoritárias criam dentro de si o fenómeno da exclusão, da antipatia e, de certo modo, de alguma soberba, criando a ideia de um espírito sofisticado e esclarecido que os demais são incapazes de atingir. A reclusão destas elites dentro de si mesmas acaba por gerar uma dinâmica acrítica e com pouca correspondência no real. Em alguns casos ganha contrastes corporativos. Semper Fi. A abertura ao real acontece, muitas vezes, apenas pela necessidade ou pelo calculismo, regressando muito rapidamente ao movimento original. 

O fenómeno das elites é um dos mais interessantes de uma sociedade moderna. Tal como no referido post do Malomil, é sempre difícil reflectirmos assertivamente sobre a sua evolução nas plataformas contemporâneas. Contudo, atrever-me-ia a dizer que há hoje uma elite online, que já se formou a partir de uma outra mais dispersa, entre jornalistas, políticos, publicistas, alguns (não muitos) artistas e gente nova que surgiu devido à diversidade dos meios, provinda dos blogs. A característica nuclear das elites está lá: é sedutora e aliciante. Mas como todas as elites, ela tende a fechar-se sobre si mesma, resguardando-se numa estética, agora muito mais abstracta mas que, com o tempo, vai se tornando mais clara. A sua grande inovação é, ainda assim, a diversidade pós-ideológica, conferindo-lhe um tom snob muito interessante e a sensação de uma falsa abertura. 

Ao mesmo tempo, assistimos ao fim de outras elites que, por falta de actualidade, acabaram por ser vítimas da sua reclusão e se extinguiram ou se dispersaram, misturando-se noutras elites.

 

29
Nov13

esquerda, direita, volver

jorge c.

Já não nos víamos há algum tempo. O único contacto que temos tem sido feito, claro, pelo Facebook, onde eu vou postando freneticamente, entre canções, manifestação política ou divulgação de outras matérias. Ele raramente interage, manifestando-se de vez em quando numa ou outra música, ou quando assinalo a memória de personalidades mais ligadas à direita. 

Desta vez, encontrámo-nos, no meio de outros amigos. A noite ia longa, tal como a amizade. A conversa foi seguindo e, inevitavelmente, caiu na política e no estado actual das coisas. De repente, vejo-o nervoso com o meu discurso e tento acalmar o tom para que se perceba o que estou a dizer com lucidez e clareza. Ele não aguenta e desata num disparate. Que eu agora sou comunista, que a esquerda é que nos meteu aqui e eu sou o idiota útil deles, agora, e que desde que fui para Lisboa isto e aquilo e aqueloutro. E por aí fora. Disparou com o que lhe estava entalado há algum tempo e que por sabe-se lá o quê, nunca quis discutir.

Esta conversa não é uma surpresa. Ao longo dos dois últimos anos, tenho sido acusado - é esta a palavra - de ser de esquerda por estar contra a conduta de um Governo de direita. Também pela esquerda, sou afavelmente recebido como uma nova aquisição. Para a esquerda, sorrio. Para a direita, mando-os estudar. A direita hoje padece de cultura e de esclarecimento. É ignorante, preconceituosa e pouco esclarecida. Para além de, muitas vezes, ser oportunista e taticista.

Não pretendo fazer aqui qualquer declaração de interesses sobre as minhas escolhas ideológicas. Era o que me faltava. Porém, há uma questão fundamental no meio de tudo isto que urge esclarecer, porque a luta política é cada vez menos esclarecida e auto-crítica. 

A coerência ideológica existe porque as pessoas se mantém fiéis a um conjunto de valores e princípios. Acima desses valores e princípios ideológicos, existem, ainda, outros mais importantes, como a dignidade humana, a liberdade, a igualdade, a solidariedade. A verdadeira incoerência reside em nos afastarmos destes princípios por oportunismo ou circunstancialismo partidário. O resto é mantermo-nos fiéis ao tipo de sociedade em que acreditamos e que juntos, democraticamente, aceitámos construir. Este é o maior valor que temos - a comunidade e o outro.

Portanto, será errado pensar que a minha deslocação foi feita para a esquerda. Em rigor, eu mantenho-me no mesmo sítio. Quem mudou foram aqueles que deixaram de colocar valores e princípios à frente do preconceito ideológico, da fantasia pseudo-liberal e da politiquinha de corredor.

No dia em que o nº2 de Durão Barroso (não sei se estão recordados deste senhor, que ia ser o nosso homem em Bruxelas) diz que é importante baixar salários para atrair investimento, com a maior das canduras, este é um assunto sobre o qual devemos reflectir para decidirmos de que lado é que vamos estar. Eu apenas decidi o meu com a minha consciência.

28
Dez12

as minhas coisas favoritas

jorge c.

Em alturas como esta oferece-se dizer que só valorizamos as coisas quando as perdemos. Mas, logo viria alguém discutir o lugar comum e a falta de sofisticação, a pouca urbanidade da coisa e a necessidade de seguir em frente. É a chamada ética dos fúteis. 

É uma merda perder as coisas. É uma merda que sejamos poucos a tentar mobilizar as pessoas para os lugares que sabemos mágicos, onde o tempo não passa e se mantem estático para que, então, uma certa transcendência nos coloque os olhos no futuro. É isso que o Jazz nos faz. É o mais perfeito instrumento da consciência livre.

Pouco pretensioso, o jazz é da rua, é dos bares generosos. Quando as ruas e os bares perdem o jazz, nós perdemos um pouco mais de liberdade, de oportunidade para lançar a conversa num precipício interminável, empurrada pela enxurrada de uísque e de fumo livre.

Hoje, de manhã, acordei com uma notícia amarga. O Catacumbas - o último speak easy, digno do nome, na cidade - fechará em fevereiro. Talvez seja mais uma das consequências do tempo que vivemos. A crise. Porém, pergunto-me se a verdadeira crise não será a mesma história de sempre: a desvalorização das coisas, a troca do brinquedo velho pelo novo, a ditadura da novidade e do trendy e assim sucessivamente. 

Este é o meu maior ressentimento, não o nego. Porque não gosto de perder as minhas coisas favoritas. 

 

 

Até jazz, Manel.

15
Mai11

Há metafísica bastante na Emel

jorge c.

Sobre o que é a esquerda e a direita tive muitas discussões com amigos ao longo dos anos. Porém, nenhuma distinção terá sido tão perfeita como aquela que RPS deu certa noite, à mesa de jantar. Disse o meu amigo que aquilo que distinguia as duas é que a esquerda não gosta da polícia e a direita não gosta dos polícias. A simplicidade desta distinção é tão maior quanto a sua assertividade. A partir de então, sempre que a discussão ressurgiu, citei sempre RPS. Confesso que o impacto não tem sido o esperado. Talvez não se dê assim tanto valor a metáforas tão simples (o que é uma pena), ou talvez muitas destas pessoas não tenham experimentado um acontecimento onde fossem confrontadas com esse factor de separação das imensas águas territoriais que rodeiam a sua natureza ideológica. São experiências que nos põem à prova.

Pois comigo, aconteceu, já lá vão cinco dias, passar por uma experiência próxima que me fez questionar o território em que me situo. Um desafio a que não soube responder imediatamente com a maior das seguranças, mas a que a metafísica, como sempre, ajudou a esclarecer. Estava eu, portanto, a encaminhar-me para o carro quando ao longe reparo que à sua volta se entrelaçava uma fita amarela. Praguejei, insultei e perdi noção de tudo o resto. Recompus-me para resolver o assunto. No vidro a informação no autocolante era clara e precisa: 90€ = 30€ de multa + 60€ para desbloquear o veículo. Enquanto aguardava que os cavalheiros da empresa municipal regressassem para me desbloquear o carro fui pensando nos motivos da minha - agora - bancarrota. Assumi o meu erro: não paguei o estacionamento pelo que me bloquearam o carro por falta de ticket. Pouco ou nada interessam as razões. Não paguei e este é um erro sancionável. Mas se a coima existe antes do bloqueio, por que razão não me haviam dado hipótese de ser apenas multado? A simultaneidade das sanções fez-me questionar a seriedade da instituição.

Chegados os funcionários da empresa municipal (uma autoridade em matéria de estacionamentos), tentei ser o mais cordato e gentil possível. O tempo que esperei fez-me pensar que aqueles homens apenas cumpriam regras e as suas funções seriam meramente administrativas, sem espaço para discricionariedades. Não deveria obrigá-los aos meus maus instintos, nem às minhas desculpas. Também não valeria a pena mostrar que era um cidadão cumpridor e que umas semanas antes teria até - diz-se - entregue um ticket a um desconhecido por ainda restar tempo de estacionamento. Esses desabafos da moralidade ficam para Deus ou para a edilidade. Paguei, despedi-me e desejei um bom dia de trabalho. Uma simpatia e adeus 90€.

Não tinha razão para me chatear com quem apenas fazia o seu trabalho. Estava então revoltado com a instituição "Empresa Municipal de Estacionamento", uma entidade fantasmagórica que habita no imaginário dos locais tanto pelo desprezo que lhes merece como pela raiva que lhes suscita. Repito que a minha revolta não se devia à sanção em si, mas sim à simultaneidade de sanções que me pareceu desadequada e, de certo modo, perversa. Teriam aqueles homens responsabilidade na adequação da sanção ao caso concreto, ou estariam apenas a seguir ordens específicas? A dúvida. Estaria eu, pela primeira vez, confrontado com a possibilidade de ter um problema com a instituição e não com o indivíduo? Ah! A metafísica!

A dúvida resolve-se quando invocamos questões de princípio. Todas as instituições que impõem acções a partir de regras, devidamente escrutinadas, têm de fazê-lo em proporção do erro cometido. Se houver um aproveitamento do princípio da proporcionalidade, a regra geral estará a ser pervertida. A responsabilidade nesta matéria é do agente que aplica a regra. Mesmo que envolva hierarquia e ordem superior, o agente tem uma escolha: cumprir ou perverter o sentido nuclear da regra. Se a filosofia da empresa, neste caso, é servir os cidadãos (e que no caso específico será bastante discutível), a perversão das suas regras implica um prejuízo para os cidadãos, uma perda de confiança institucional, em abstracto. Perde-se o valor institucional à conta da cobardia do agente local.

Depois desta reflexão respirei de alívio. RPS ainda tinha razão, ou o mesmo será dizer que eu ainda navegava pelas mesmas águas, sem ilusões ou confusões do território. E de repente todos aqueles adágios repetidos à exaustão fazem sentido: a árvore e a floresta, a andorinha e a primavera. A questão de princípio será sempre a mesma: a instituição nasce pura, o homem é que a corrompe.

14
Mar11

A precariedade da consciência política

jorge c.

Não se pode ignorar que o que aconteceu por todo o país no Sábado é um protesto com relevância. Resta-nos é perceber que tipo de relevância é que está aqui em causa: quantitativa, qualitativa ou as duas.

Ao longo da tarde de Sábado fui acompanhando a manifestação através dos directos na televisão que, de forma aleatória, iam recolhendo testemunhos. Não se tratam de peças editadas e trabalhadas com uma narrativa específica, mas sim entrevistas em directo, sem qualquer critério, feitas ao longo de toda a manifestação. A ideia que passou para fora foi que se tratava de um protesto político contra a governação. No meio disso havia um tópico: a precariedade. Mas, para muitos dos manifestantes, a precariedade é um problema político imediato.

Vejamos por que é que isto não faz sentido. A precariedade, simbolizada pelo recibo verde, é uma realidade cada vez mais preocupante. Ninguém duvida disto. O tratamento que damos ao tema não pode, por isso, cair numa reivindicação inconsequente. Temos o exemplo da questão levantada pelos falsos recibos verdes que não são objectivamente um problema que compete ao poder político mas sim ao poder judicial. Dir-me-ão que os tribunais não funcionam, ao que eu respondo que se não recorrermos a esses mecanismos é certo que eles não funcionam. E o discurso à volta de tudo isto torna-se inconsequente porque não avalia bem todos os dispositivos democráticos espelhados no princípio da separação de poderes. Mesmo a conversa do não funcionamento da justiça tem muitas vezes que ver com a subjectividade do caso. Não é por eu achar que o meu recibo verde é falso que ele o é, de facto, e que isso é um problema geral. Confundir uma frustração com um direito é um erro. O que aconteceu no Sábado foi mais um aglomerado de frustrações do que uma reivindicação certa, objectiva e bem definida. A indignação, a vergonha e todos os outros sentimentos expressados não são uma reivindicação, são sentimentos e a sua manipulação é demagogia.

Posto isto, é legítimo que nos manifestemos contra algo que nos parece ultrapassar todos os limites éticos. Até aqui, de acordo. Acontece que a não existência de um caderno reivindicativo dá azo a que a manifestação não tenha uma narrativa coerente. Se este era um protesto contra a precariedade porque razão se tornou numa manifestação anti-governo?

Em rigor, as medidas propostas por alguns dos manifestantes (um nicho com pouca expressão no meio de 300 mil pessoas) não se afastam daquilo que é uma parte do programa do Bloco de Esquerda. Falar em demissão do governo torna-se, então, numa manobra pouco séria quando o Bloco saiu há 1 ano e meio de eleições com 9,81% dos votos; depois de ter apresentado uma moção de censura que foi chumbada pelo Parlamento na semana passada. Tudo isto - esta reverência pela preponderância popular - é um desrespeito absoluto pela democracia representativa e, acima de tudo, pela memória de uma ditadura sem partidos e sem representatividade. Falar-se, então, de um novo 25 de Abril é falta de consciência política, da mais básica possível.

Também a participação da JSD é bastante caricata. Que eu saiba, a JSD tem deputados na bancada parlamentar do PSD. O que andam eles a fazer? Na manifestação foi evidente o que andaram a fazer: propaganda anti-governamental. O que é absolutamente legítimo, mas convenhamos que encerra só por si a ideia de uma manifestação sem pretensão anti-governamental. E se o problema era a política laboral, onde está a proposta política da JSD até hoje que, ao que eu saiba, ainda é uma organização político-partidária?

Chegamos aqui a um ponto em que se torna tudo muito confuso e inconsequente. É uma manifestação aberta que permite que todos apresentem as suas reivindicações. Essas reivindicações são anti-governamentais. Logo, é nisso que a manifestação se torna. E se o é, porque razão aquelas 300 mil pessoas não votaram nesse sentido nas últimas eleições? Revolucionar um sistema democrático para transformar o sistema político em quê? Se não aceitam resultados de um sufrágio universal, aceitam o quê?

Respondendo à minha primeira questão: a manifestação de Sábado tem relevância quantitativa. O descontentamento de centenas de milhares de pessoas não pode ser ignorado pelos responsáveis políticos, nomeadamente pelo Governo, pelo Presidente da República e por todos os partidos com assento parlamentar. Não foi uma manifestação com relevância qualitativa devido à vacuidade do protesto, à inconsequência e diversidade de movimentos gerados espontaneamente sem qualquer ligação de conteúdos entre si. Não há muito a retirar de discussões de café agrupadas na rua, mesmo que isso pareça uma coisa linda. A estética revolucionária engana sempre.

Sou profundamente solidário com os receios, frustrações e com o desespero do próximo. Sou intolerante à demagogia.

24
Fev11

Das regras

jorge c.

O que se passou em Paços de Ferreira tem interesse geral, como bem afirma o Bloco de Esquerda. O meu amigo RPS costuma dizer que a direita e a esquerda distinguem-se da seguinte forma: a esquerda não gosta da polícia e a direita não gosta de polícias. É bem verdade que a discussão passa sempre por aqui e perde a força do interesse efectivo que tem para a sociedade, mesmo quando se trata de uma questão de direitos fundamentais. Não importa aqui afirmar qualquer opinião sobre o caso em concreto por falta de enquadramento. Não sabemos, em rigor, o que se passou nem ao que estavam autorizadas as forças de segurança do estabelecimento prisional. Depois do inquérito talvez possamos chegar a mais alguma conclusão. Mas, antes, importa sim discutir a relevância deste assunto e por que razão estiveram bem todos os partidos ao concordar com a audição do Ministro da Justiça.

A evolução do direito penal e dos seus vários ramos tem sido muito rápida nos últimos 20 ou 25 anos. Hoje, por exemplo, já não se entende a pena como um correctivo, mas como uma forma de retirar direitos e liberdades. A proporcionalidade é um dos princípios fundamentais nesta filosofia que decidimos adoptar para a melhor satisfação do interesse geral, como salvaguarda dos direitos humanos. Se pode acontecer a um, pode acontecer a todos. Assim, não faz sentido a utilização de instrumentos que tenham como propósito infligir dor para imobilizar. É importante que, dentro daquilo que seja a sua discricionariedade, um agente de segurança saiba agir em proporção.

Com efeito, é este o momento em que partimos para uma ideia mais abstracta: a de que é fundamental que as instituições sejam rigorosas no cumprimento das regras e na sua auto-regulação. Todas as instituições têm uma característica em comum que é ser uma criação da lei. Por conseguinte, estão vinculadas a um conjunto de regras perfeitamente definidas. Logo, a prevaricação será sempre um factor de descredibilização das instituições. E quando falamos de forças de segurança o assunto ganha ainda um peso maior porque se tratam de organismos que têm por objectivo assegurar a segurança de todos os cidadãos e protegê-los ao abrigo da lei. Um estabelecimento prisional não é excepção.

É claro que o meu amigo RPS tem razão na sua distinção. Acontece que quando se trata de avaliar a prestação da polícia não o podemos fazer com essa leveza. Há um bem muito maior a proteger: a segurança de todos, incluindo a da própria instituição. Porque uma instituição descredibilizada é uma instituição desrespeitada e fútil.

12
Fev11

Ainda Black Swan

jorge c.

Há uma frase do Chesterton no Tremendas Trivialidades de que gosto bastante e que tenho citado muito: "O mundo nunca morrerá à fome por falta de maravilhas, mas apenas por falta de se maravilhar." Foi isto que pensei com as críticas que ouvi a Black Swan. Quer dizer, primeiro pensei "estúpidos" e só depois é que pensei com erudição. É sempre assim, primeiro somos grosseiros e depois é que vem a erudição, excepto com aquelas pessoas que escrevem nos blogs colectivos de esquerda com rigor científico que são muito chatas.

Mas, dizia eu, as críticas que tenho ouvido são bastante incompreensíveis porque partem de premissas erradas. Primeiro, o filme é previsível. Ora, nem todos os filmes têm um twist, mas acho curioso que se diga isso em relação à relação de Nina com os outros e não com ela própria. Segundo, a temática é um cliché psicológico (diz o meu amigo Rodrigo, mais assertivo). Sim, talvez, mas também o foram o Dr. Jekyll and Mr. Hyde, o Shinning ou The Rise and Fall of Ziggy Stardust e muito mais coisas desde o início dos tempos, certamente. O homem tenta compreender e discutir a sua mente através de processos criativos e a partir de realidades novas. E é precisamente na abordagem que está a novidade deste filme. Tem se visto algo relativamente próximo em Sofia Coppola e a dimensão interior das suas personagens. São coisas simples e se calhar chatas para quem quer ver apenas filmes complexos com grandes twists. Assim sendo, teríamos o mundo entregue a Fincher. Mas, na simplicidade também reside a beleza. É isso que Chesterton pretende dizer com aquela frase.

Entretanto, vi o Shaft em África - The brother man in the mother land. Talvez assim percebam melhor o que quero dizer.

06
Fev11

De como Žižek está errado

jorge c.

O patusco Slavoj Žižek lá regressou com a sua habitual evangelização carregadinha de manipulação intelectual e preconceitos. Eu acho piada a Žižek, mas não posso deixar de notar esta sua tendência para a manipulação através de um discurso todo fixolas que a malta curte, tipo ya. Ora, como eu não curto, tipo ya, que a malta curta, tipo ya, achei por bem demonstrar como a ideia de fundo, de boa-fé, não é má de todo, mas o raciocínio e a justificação são absolutamente falsos. Isto não é uma discussão filosófica, por amor de Deus! Isto tem a ver com factualidade.

Portanto, diz-nos o nosso camarada: "Vamos lá romper o impasse da dicotomia entre liberais anémicos e extremistas". Porreiro. Por mim tudo bem. Mas, se formos lendo vemos que o único problema que Žižek tem é com os liberais-conservadores (suposição minha). É estranho, não é? Os extremistas até são capazes de se adaptar, os liberais é que andam a empatar isto tudo.

Mais à frente, como não poderia deixar de ser, vem a entrada a pés juntos a Cristo. O pobre desgraçado morre na cruz para a redenção dos pecados da rapaziada toda, mas ainda assim ele acha que o escandaloso Jesus só queria malta da dele. Claro. Todos nós sabemos que a teleologia cristã é promover o ódio. Eu julgava que a confusão entre a base do cristianismo e as atitudes da Igreja Católica tinha desaparecido no início do Séc. XX. Mas pelos vistos, ainda há quem use a mesma técnica usada pelos jacobinos do início do século. Ya, como está de se ver.

Aproveitando o facto de estar com a mão na massa, vamos lá falar dos conservadores, misturando com os liberais de forma a parecer que está tudo enfiado no mesmo saco. A malta da JCP normalmente não repara, e pelo que vejo, a do Bloco também não, tal é a ansiedade de concordar com o mestre. Estou a ser preconceituoso? Estou, porque eles merecem. Não sejam carneirinhos e a gente conversa. Até lá: aguenta, rapaz! (Esta referência ao Mário-Henrique Leiria foi só para competir com a do Chesterton para mostrar que nós também lemos cenas e assim).

Portanto, para o Žižek o facto dos conservadores insistirem "que cada Estado se baseia num espaço cultural predominante, que deve ser respeitado pelos membros de outras culturas habitando no mesmo espaço", significa automaticamente que se vão silenciar em relação ao racismo e perder a autocrítica. Claro, é uma lógica fortíssima. Como é que eu nunca pensei nisto? Ou seja, i conservador, que desejo que a minha comunidade se mantenha inalterada na sua estrutura, na sua cultura, através de um desenvolvimento sustentável de todas as suas premissas, serei um racista por negligência. Certíssimo quanto a honestidade intelectual e compreensão de posições ideológicas diferentes.

É claro que eu acredito numa sociedade integradora e que dê espaço ao outro: na sua religião, na sua cultura, no seu quotidiano. Todos os dias faço concessões. É esta a minha forma, e a de muitas outras pessoas, de aceitar uma Europa mais sofisticada e democraticamente madura. Mas é isso mesmo, eu faço concessões. Slavoj Žižek não faz. Para ele, o problema reside apenas num dos lados de uma barricada que ele continua a alimentar para beneficiar a sua narrativa ideológica. É um discurso radical que se manifesta na imposição das ideias a partir de manipulação preconceituosa. Em democracia, o espaço do diálogo não deve estar só limitado aos que concordam connosco. Ora, quando se atirou a Cristo, Žižek estava a projectar.

09
Jan11

Mad World

jorge c.

A imagem do fim pode estar nos pássaros que caem mortos, nas devastadoras cheias, no aumento da população mundial ou nos climas de guerra. Mas nada pode ser mais catastrófico do que uma sociedade que não se consegue respeitar e perde todas os seus traços solidários. Se há algo que nos pode ajudar a manter a lucidez num tempo de hecatombes é a prática de uma escala de princípios e valores assente na melhor relação de todas as dimensões humanas. Quando isso falha deparamo-nos com um cenário de fim dos tempos pouco ou nada original.

 

04
Nov10

A função social das empresas

jorge c.

Se um dos problemas do país é, neste momento, a crise de valores, temos de perceber de que valores estamos a falar. Não se pode apenas atirar para o ar um pacote de lugares comuns do moralismo. É preciso avaliar com atenção a função de cada um no meio.

O que entendemos, então, por função social das empresas? Para além da evidente relevância que as empresas têm no desenvolvimento social e do impacto dos seus produtos e serviços, estes sujeitos têm uma função interna para a estabilidade das comunidades. A sua organização é fundamental não só para responder ao mercado como também para dar qualidade de vida aos seus trabalhadores. Não são, por isso, positivas as cargas horárias impostas pelos empregadores, nomeadamente a jovens trabalhadores que estão dispostos a tal por se encontrarem no início de carreira e recearem o desemprego.

Pode parecer um assunto insignificante, mas não é. Repare-se que com uma carga horária pesada não é possível viver fora das empresas, despender tempo para as famílias, aproveitar as vilas e cidades, patrocinar actividades socio-culturais, não só criando públicos como participando; não é possível, enfim, viver, ter vida, mundo. E a falta de mundo é hoje um problema grave no seio das empresas, porque dele nasce a compreensão, a inteligência e a capacidade de evoluir. Mais: quanto maior é o volume de negócio da empresa mais esse cuidado deve ser tido em conta. É que, no fim de contas, o cansaço da dedicação sem retorno desgasta a imagem de qualquer negócio. No limite, a insatisfação gera desconforto e insegurança e isso pode ter efeitos perigosos - a saúde, por exemplo.

Este é, sobretudo, um problema de organização. Gastam-se rios de dinheiro em acções de formação, de motivação e coaching, mas é-se incapaz de olhar para dentro e perceber um grupo de pessoas.

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